segunda-feira, 30 de maio de 2011

GAIVOTA

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Fotografia / Sentidamente
És segurança alada em voo picado.
Significas o premente desejo de partir.
No temporal, és vento amainado.
Na fúria do mar, som de bramir.
És o sonho, a leveza, em ir e vir.
Sereno voo, por brisas bafejado…

Aliança eterna, com o mar profundo.
Habitante de margem, sem idade.
Atento perscrutador do mundo
num horizonte, sempre novidade.
És cortar de ondas, com temeridade,
espelho estilhaçado a cair no fundo…

Um pouco de mim és, gaivota perdida:
ciclando esperas, poisando rochedo,
cheirando odores de alga esquecida,
entre ácidos sons e incutido medo.
Mas vais singrando dias sem degredo
e passa latejando, fulgorosa, a vida.

Jesus Varela

terça-feira, 24 de maio de 2011

ESTOU AINDA

. Fotografia / Sentidamente

No outro lado de mim, estou ainda.
Tons de amenidade, quero assumir.
Qualquer réstia de sol, será bem vinda,
se me trouxer paz, e crença no provir.


Vivo, num mirar constante em espelho fundo.
Anulo-me e resto só, petrificada.
Vejo passar lentos, os dias deste mundo,
numa passividade de ave embalsamada.
Faço tempo, no virar de qualquer esquina.
Piso todas as irregularidades das calçadas.
Vou vestindo velhos trapos de menina,
a fingir grandiosos, os pequenos nadas.

Dentro de mim, ainda guardo esperança.
Mas sempre receosa, fico alerta…


Vivo, num oscilar constante de balança
que perdido o fiel, se desconcerta.

Jesus Varela

terça-feira, 10 de maio de 2011

SERENIDADE

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Fotografia / Sentidamente

AINDA O TEJO

Hoje colho das águas
o sereno gosto do embalo…
Sem ondas, sem vento,
domina um sono de além…

O bote, ancorado na corrente,
ensaia passos de dança,
ritmando o vai e vem…

Cintila o rio, no esquecimento
dessa eterna função de estrada.
Algures, um brilho mais intenso
lembra alguma estrela afogada,
fugidia ao firmamento,
no risco da última madrugada…

Implícita, voga a esperança,
pois a espera sempre a tem.
Muito longe, anda a guerra
e o nefasto que contém…

Sem lembranças, sem passado e sem presente,
ameno a alma e purifico o coração.
No palco, onde a natureza impera sobre a gente,
sou esquecido cenário em construção
e deixo-me embalar suavemente.

Jesus Varela