sábado, 29 de maio de 2010

VIGÍLIA

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Fotografias / Sentidamente (O mesmo local, o mesmo findar do dia. Só alguns minutos, separam os dois registos).

Veio o entardecer! O Sol ao sair
para lá da linha do horizonte,
deixou ainda no rasto do seu ir,
nuvem doirada, em forma de bisonte…

Avoluma-se a solidão dos grandes nadas.
Guardados em espaços reduzidos.
Vêm de longe, risos e gargalhadas,
cruéis, ferir-me o silêncio dos ouvidos
e quebrar a paz das horas desejadas.

Depois do desgaste de tantas emoções,
resto, a retorcer as mãos fechadas.
Impotente, caminho aos tropeções,
querendo ainda, alisar cadeias enleadas
e escancarar todos os portões…

Do relógio, arrasto na noite a lentidão!
Insone, leio no balanço onde me afundo:
o lento gastar do tempo em progressão;
a inutilidade da passagem neste mundo.
Tudo o que foi promessa, hoje é negação!
Estou cansada de ruínas sem sentido!
Farta de lutar por tudo e não ter nada...

Novo dia, dentro em pouco já vem vindo.
Soçobro no fruir de mais uma madrugada!

Jesus Varela

sábado, 22 de maio de 2010

QUEM DERRAMOU OIRO PELO DIA?

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Fotografias / Sentidamente
Quem derramou oiro pelo dia?

Tão luminoso, docemente brilha!
Temperando de sentimento a nostalgia.
Encarnação em pura maravilha!...

Oiro nas árvores, desfolhadas, quase nuas.
No chão, em securas e dormências,
e nas pisadas, pedras das ruas,
despertando o embalo de cadências!

Oiro com brilho de acalentar sonho.
Encantamento tal, torna a alma leve!

Oiro roubado, a um qualquer dono.
Mas confiante, nada teme e nada deve!

Oiro a nimbar os sentimentos.
A ditar a paixão e o amor sereno.
Oiro derramado por breves momentos,
sobre toda a terra, num pairar ameno.

Oiro em que embrulho segredos
e sem cobiça, retenho e emalo.
Oiro macio, recolhido entre os dedos.
Afundado na alma, onde quero guardá-lo!

Jesus Varela

domingo, 16 de maio de 2010

NOSTALGIAS

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Fotografias / Sentidamente
Os meus velhos não têm idade!
Vejo-os com os olhos bem abertos,
À luz de ontem…
Não dum olhar gasto, enrugado, esquecido…
Os meus velhos nunca serão velhos!
Só assim, perdurará a criancinha que fui,
no conforto de sabê-los lá.

A casa não ficou velha!
Não derruiu um pouco em cada ano.
Não pode ser verdade!
Ainda vislumbro o sonho do seu reviver,
Por entre as brumas dum tempo cinzento…

Mesmo as lajes do cemitério,
Que escondem os queridos,
Não são reais… Não podem ser reais…
Eles estão ainda nos longínquos lugares,
Vivos de memórias…
Deixando um rasto inapagável.

Jesus Varela

sábado, 8 de maio de 2010

DELÍRIO

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Fotografias / Sentidamente
Desfolhei todas as rosas
do meu jardim
e ofereci ao vento
pétalas sem fim.
Como nacaradas pérolas
dum alado colar,
foram…
Gritando perfumes
ao espantado luar.


Perturbante ficou a noite.
Perdido o escuro de breu,
num registo tão longe do seu!
Discretamente foi-se embora.
Lesto era o tempo
para interrogar.

Cavalgando a rosada aurora,
um outro dia estava a chegar…

E eu, cansada da hora tardia,
vencida senti, os olhos fechar…

Jesus Varela